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UNIÃO - CORONAVÍRUS / FUNCIONAMENTO DE ÓRGÃO PÚBLICO / NOTA TÉCNICA CONJUNTA N° 3

17 Março 2020 | Tempo de leitura: 13 minutos
Diário Oficial da União

Nota Técnica para a atuação do Ministério Público do Trabalho em face das medidas governamentais de contenção da pandemia da doença infecciosa (COVID 19) para assegurar a igualdade de oportunidades e tratamento no trabalho para trabalhadoras e trabalhadores.


Diploma Legal: Nota Técnica Conjunta n° 3
Data de emissão: 17/03/2020
Data de publicação: 17/03/2020
Fonte: Diário Oficial da União
Órgão Emissor: MPT - MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO

Nota da Equipe Legnet

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO — PROCURADORIA GERAL DO TRABALHO, pelo Procurador Geral do Trabalho in fine assinado, a COORDIGUALDADE – Coordenadoria de Promoção da Igualdade de Oportunidades e Eliminação da Discriminação no Trabalho, instituída pela Portaria 273/2002, a CODEMAT – Coordenadoria Nacional de Defesa do Meio Ambiente do Trabalho, instituída pela Portaria n. 410/2003 e a CONAP – Coordenadoria Nacional de Combate às Irregularidades Trabalhistas na Administração Pública, instituída pela Portaria n. 409/2003, com fundamento na Constituição da República, artigos 5º, caput, I, 7º, VI, XIII, XIV, XXII e XXXIII, 127, 196, 200 e 227, na Lei Complementar n. 75/93, em seus artigos 5º, III, alínea “e”, 6º, XX, 83, V, e 84, caput, na Convenção sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência (Decreto 6949/2009), na Lei 10.741/2003 (Estatuto do Idoso), na Lei n. 8080/90 (Lei Orgânica da Saúde) em razão da declaração de pandemia do novo coronavírus (SARS-COV-2) pela Organização Mundial da Saúde, ocorrida em 11 de março de 2020, bem como pelas medidas de contenção da doença anunciadas até o momento pelos órgãos governamentais de algumas unidades da Federação – Distrito Federal, São Paulo, Rio de Janeiro, Bahia, entre outros - expedem a presente Nota Técnica com o objetivo de indicar as diretrizes a serem observadas, por empregadoras e empregadores, empresas, sindicatos, órgãos da Administração Pública, nas relações de trabalho de trabalhadoras e trabalhadores com encargos familiares, a fim de garantir a igualdade de oportunidades e de tratamento no trabalho.

Existem sete coronavírus humanos conhecidos, dentre os quais estão incluídos o causador da SARS (síndrome respiratória aguda grave), o da síndrome respiratória do Oriente Médio (MERS) e o COVID-19. O conhecimento adquirido com os surtos e epidemias pretéritos tem orientado as medidas de precaução e prevenção adotadas para o novo coronavírus, cujo modo de transmissão e o comportamento da doença estão sendo estudados à medida que os casos são identificados, em especial em países com diferentes características climáticas e socioambientais.

Os sintomas variam de leves a muito graves, podendo chegar ao óbito em algumas situações, prevendo-se que o período de incubação, ou seja, o tempo entre a exposição ao vírus e o aparecimento dos sintomas pode variar de 2 a 14 dias. A transmissão ocorre de pessoa a pessoa a partir de gotículas respiratórias ou contato próximo (dentro de 1 metro). Assim, pessoas em contato com alguém que tenha sintomas respiratórios (por exemplo, espirros, tosse, etc.) estão em risco de serem expostas a gotículas respiratórias potencialmente infecciosas.

As pessoas portadoras do vírus, mas sem manifestação ou com manifestações leves, dificultam o controle e aumentam a chance de propagação dos casos, o que levou diversos gestores públicos a determinar a suspensão das atividades em escolas e creches em diversas unidades da Federação (Distrito Federal, São Paulo e Rio de Janeiro). As medidas de segurança têm sido atualizadas, razão pela qual o presente documento deve ser acompanhado da atualização dos canais oficiais da Organização Mundial da Saúde (OMS), do Ministério da Saúde (MS) e da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), bem como das decisões administrativas adotadas pelos órgãos locais.

Diante da indiscutível importância de respeito às medidas adotadas, é necessário ressaltar o papel de toda a sociedade no esforço conjunto de conter a disseminação da doença coronavírus (COVID-19), respeitando-se os direitos das trabalhadoras e trabalhadores com encargos familiares.

No Brasil, a Lei Orgânica da Saúde – Lei n. 8.080/90 prevê que a saúde é direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis aos seu pleno exercício (artigo 2º, caput). Porém, também deixa claro que o dever do Estado não exclui o das pessoas, da família, das empresas e da sociedade (parágrafo 2º).

Do mesmo modo, o artigo 227 da Constituição da República e o artigo 7.2 da Convenção sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência estabelecem ser dever da família, sociedade e Estado a garantia de proteção integral de crianças e adolescentes, como prioridade absoluta, incumbindo-lhes colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. Situação prioritária esta que se repete em relação à pessoa idosa, conforme os artigos 3º e 4º da Lei n. 10.741/2003 (Estatuto do Idoso).

A Convenção 156 da Organização Internacional do Trabalho – OIT, ainda que não ratificada pelo Brasil, constitui marco normativo a ser utilizado como parâmetro para a interpretação legal na adoção de políticas pública ou decisões pelos poderes públicos, em todas as suas instâncias, para garantir a igualdade de oportunidades e de tratamento a trabalhadoras e trabalhadores com encargos familiares. Referidas normas devem integrar o conteúdo essencial do princípio da igualdade e não discriminação, previsto no art. 5º da Constituição da República. Em consequência, todas as empresas, empregadoras ou empregadores têm obrigação de adotar medidas necessárias para facilitar a compatibilidade da vida profissional e familiar em face das orientações dos poderes públicos para a contenção da disseminação da doença COVID-19.

Nesse contexto de esforço coletivo em prol de toda a sociedade brasileira, o Ministério Público do Trabalho ressalta que a valorização do trabalho é um princípio fundamental da sociedade brasileira (art. 1º da Constituição da República), cuja continuidade e estabilidade na prestação de serviços são fatores indispensáveis à paz social. Ademais, o trabalho é um determinante social que não pode ser esquecido (art. 3º da Lei n. 8.080/90) pelas medidas de contenção da disseminação da doença COVID-19.

Ante o exposto, diante das medidas de contenção da disseminação da doença coronavírus (COVID-19), ORIENTA-SE A ATUAÇÃO DAS PROCURADORAS E PROCURADORES DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO, em especial das Coordenadorias Regionais da COORDIGUALDADE, CODEMAT e da CONAP, da seguinte forma:

1. Recomendar às empresas, órgãos públicos, pessoas dos empregadores, sindicatos patronais e profissionais, de todos os setores econômicos ou entidades sem fins lucrativos, que nas medidas de flexibilização da prestação de serviços assegurem a igualdade de oportunidades e de tratamento de trabalhadoras e trabalhadores com encargos familiares, tais como:

a) GARANTIR a todas as trabalhadoras e todos os trabalhadores com encargos familiares (com filhas ou filhos, pessoas idosas ou com deficiência, pessoas com doenças crônicas que podem ter seu quadro agravado pelo COVID-19, dela dependentes), gestantes, pessoas idosas ou com deficiência o direito a realizar as suas atividades laborais preferencialmente de modo remoto, por equipamentos e sistemas informatizados;

b) ESTABELECER política de flexibilidade de jornada quando serviços de transporte, creches, escolas, dentre outros, não estejam em funcionamento regular, conforme comunicados de autoridades ou diretorias das respectivas empresas responsáveis pelo transporte e direções das escolas e creches, ou entes similares, observado o princípio da irredutibilidade salarial;

c) ESTABELECER uma política de flexibilidade de jornada para que os trabalhadores atendam familiares doentes ou em situação de vulnerabilidade à infecção pelo coronavírus, e obedeçam a quarentena e demais orientações dos serviços de saúde, observado o princípio da irredutibilidade salarial;

d) SEGUIR OS PLANOS DE CONTIGÊNCIA E REORGANIZAR a atividade empresarial, em caso de a prestação de serviços contratada se realizar na modalidade presencial, prevendo: banco de horas, antecipação das férias, ou medidas negociadas similares, de modo a favorecer preferencialmente trabalhadoras e trabalhadores com encargos familiares, gestantes, pessoas idosas ou com deficiência, nos períodos em que as decisões das autoridades públicas tiverem repercussão direta na organização da rotina familiar ou resulte na limitação do direito de ir e vir das pessoas;

e) BENEFICIAR trabalhadoras e trabalhadores, quando estes constituírem famílias monoparentais, ou seja, forem os únicos responsáveis por crianças e adolescentes, idosos e pessoas com deficiência que necessitem de cuidados em sua família, buscando medidas flexibilizadoras da prestação de serviços, ou em último caso, a sua substituição temporária, sendo-lhe assegurado o direito à manutenção da relação de trabalho.

f) ESTABELECER política de autocuidado para identificação de potenciais sinais e sintomas, com posterior isolamento e contato dos serviços de saúde na identificação de

casos suspeitos.

g) SEGUIR (ou DESENVOLVER internamente) os planos de contingência recomendados pelas autoridades locais em casos de epidemia, tais como: permitir a ausência no trabalho, organizar o processo de trabalho para aumentar a distância entre as pessoas e reduzir a força de trabalho necessária, permitir a realização de trabalhos a distância, observado o princípio da irredutibilidade salarial; f.1. Considerando que a pandemia caracteriza situação excepcional e motivo de força maior, recomenda-se que medidas capazes de caracterizar a interrupção da prestação de serviço não impliquem em redução da remuneração dos trabalhadores, por aplicação analógica do disposto no Art. 60, § 3º, da Lei nº 8.213/91;

2. Recomendar às empresas, órgãos públicos, pessoas dos empregadores, sindicatos patronais e profissionais, de todos os setores econômicos ou entidades sem fins lucrativos, que NÃO PERMITAM a circulação de crianças e demais familiares dos trabalhadores nos ambientes de trabalho que possam representar risco à sua saúde, seja de adoecimento pelo COVID-19, seja dos demais riscos inerentes a esses espaços;

Considerando a situação excepcional e o motivo de força maior, as ausências ao trabalho ou a adaptação da prestação de serviços por força dos encargos familiares são aplicáveis igualitariamente a trabalhadoras e trabalhadores, bem como não poderão ser considerados como razão válida para sanção disciplinar ou o término de uma relação de emprego, podendo configurar ato discriminatório, nos termos do artigo 373-A, II e III, da CLT, artigo 4º da lei n. 9.029/95.

Feitas essas considerações, o Procurador-Geral do Trabalho, a COORDIGUALDADE, CODEMAT E CONAP, no âmbito de suas atribuições, orientam as procuradoras e procuradores do Ministério Público do Trabalho a acolher as sugestões supra elencadas, sem prejuízo de outras medidas pertinentes à espécie de acordo com o caso concreto, como forma de atuação resolutiva deste parquet a contribuir decisivamente nos esforços de todos os órgãos vocacionados à contenção da disseminação da doença coronavírus (COVID-19).

Brasília-DF, 17 de março de 2020.

ALBERTO BASTOS BALAZEIRO

Procurador-Geral do Trabalho

ADRIANE REIS DE ARAUJO

Coordenadora Nacional

da Coordenadoria de Promoção da Igualdade de Oportunidades e Eliminação da Discriminação no Trabalho

ANA LUCIA STUMPF GONZALEZ

Vice Coordenadora Nacional da

Coordenadoria de Promoção da Igualdade de Oportunidades e Eliminação da Discriminação no Trabalho

MÁRCIA KAMEI LOPEZ ALIAGA

Coordenadora Nacional

Coordenadoria Nacional de Defesa do Meio Ambiente de Trabalho

LUCIANO LIMA LEIVAS

Vice-Coordenador Nacional

Coordenadoria Nacional de Defesa do Meio Ambiente de Trabalho

ANA CRISTINA DESIRÉE BARRETO FONSECA TOSTES RIBEIRO

Coordenadora Nacional

Coordenadoria Nacional de Combate às Irregularidades Trabalhistas na Administração Pública

ILEANA NEIVA MOUSINHO

Vice-Coordenadora Nacional

Coordenadoria Nacional de Combate às Irregularidades Trabalhistas na Administração Pública